Educação influencia comportamento homossexual
25-02-2010 12:27
Ilídio Leandro, bispo de Viseu, não retira uma vírgula ao que tem dito e escrito sobre temas polémicos no seio da Igreja Católica. Lamenta que algumas das suas posições tenham sido reveladas fora do contexto, mas mantém a defesa do uso do preservativo para evitar doenças e da separação de casais em casos de violência doméstica. Apoia o fim do celibato dos padres e condena o enriquecimento ilícito. Em entrevista ao "Jornal de Notícias" realça a solidariedade de outros bispos, diz não estar a ser perseguido por delito de opinião, mas revela perplexidade pelo "fundamentalismo" expresso por leigos de vários cantos do Mundo. Não esperava reacções tão negativas dos leigos às suas posições? Não desta forma. Sei que há clivagens, muitas vezes por ignorância ou desconhecimento, mas não contava receber tantas mensagens e e-mails de leigos a condenar o que disse ou escrevi. Pessoas que não conheço, inclusive de outras nacionalidades, reveladoras de um fundamentalismo tremendo que eu não pensava existir. Reacções muito violentas que me deixaram chocado. Interrogo-me se não devemos ser todos mais tolerantes. A Santa Sé pediu-lhe explicações sobre a defesa do preservativo? Não. Nem estava à espera que isso acontecesse. Na igreja há pluralismo e respeito absoluto pela pessoa humana, pela sua dignidade, pelas suas diferenças e valores. E os bispos portugueses? Estive em Fátima quatro dias, num encontro episcopal, e fui tratado com muita amizade e compreensão pelos colegas. Como de resto aconteceu com a comunidade, padres e leigos, da minha diocese. Quem leu o artigo sobre o uso do preservativo reconhece o contexto em que o escrevi. Que contexto foi esse? Escrevi o artigo a admitir o uso do preservativo, na linha da doutrina da igreja, para fazer vir ao de cima temas que Bento XVI desenvolveu na visita que fez a África e que os jornalistas ignoraram. A única coisa que causou alarido foi o Papa ter condenado a utilização do preservativo, considerando que a sua distribuição não resolvia o problema da Sida. A culpa é dos jornalistas? Na verdade fizeram comigo o que fizeram com o Santo Padre: descontextualizaram a palavra preservativo. Foi um mau serviço, mas não creio que o tenham feito por má fé. O desconhecimento da realidade, leva a que surjam nos jornais, como escândalo ou novidade, coisas que fazem parte da doutrina da Igreja. A culpa se calhar também é nossa por ausência ou deficiente comunicação. Mas defendeu o preservativo enquanto o Papa o condenava... Defendi que uma pessoa infectada por doença, que não abdique de ter relações sexuais, mesmo sabendo que há o risco de contaminar ou até provocar a morte do parceiro, é moralmente obrigada a prevenir-se. Isso faz parte da doutrina social da Igreja. O Papa Bento XVI, responsável pela Igreja Universal, tem de apontar o ideal. Não podem esperar que ele diga outra coisa. Controlar a natalidade com métodos naturais faz sentido hoje? A Igreja aceita e propõe métodos naturais para uma paternidade e maternidade responsável. Deixa de fora os recursos artificiais. Mas há excepções. Em períodos transitórios, os casais podem usar métodos artificiais de controlo da natalidade, desde que nunca sejam abortivos e tenham sido determinados pelos médicos. Diz defender uma Igreja para as pessoas do século XXI... Na Idade Média a Igreja esteve atenta às pessoas da época. O século em que vivemos tem de fazer o mesmo. É preciso ter respostas para as novas realidades. Não há aqui uma contradição? Creio que não. Embora a Igreja aconselhe e busque o ideal, nunca vai abandonar quem falha, quem usa a pílula, quem faz o aborto. Estará sempre ao lado das pessoas feridas, caídas e que pela sua fragilidade ou até pela sua falta de formação, não aceitam e acompanham a vida da igreja. Há dias defendeu o fim do celibato dos padres. Mais uma polémica? Não é meu propósito. Neste caso, e sempre que me pedem opinião, recorro à doutrina da Igreja. O celibato dos padres, fundado no século XI, já vinha de um hábito e de uma tendência muito anterior, fruto de uma opção radical por Jesus Cristo e por uma consagração efectiva a Deus. Fruto dessa realidade, a Igreja latina, ao contrário das oriental e ortodoxa, mantém essa prática. Essa lei que no século XI se estabeleceu poderá a seu tempo, com uma reflexão profunda e madura, ser alterada. O tema está em cima da mesa? Neste momento, não. Mas a seu tempo pode haver alterações. Poderia ser uma solução para atacar a crise de vocações? Tenho dúvidas. As igrejas ortodoxa e do oriente, que aceitam homens casados ou que venham a fazê-lo, têm testemunhado que isso não ajudou a resolver o problema das vocações. Ser sacerdote, muito mais do que ser casado ou não, é assumir um estilo de vida ligado a valores intrínsecos e a uma entrega total aos outros. Há quem defenda a ordenação de mulheres... Ao contrário do que acontece com os homens, a ordenação de mulheres não tem tradição na Igreja primitiva nem no tempo de Jesus. Fazê-lo implicava uma alteração profunda no seio da Igreja. Esta realidade não significa, no entanto, um menor reconhecimento pela dignidade e igualdade da mulher. Apoia a separação do casal num cenário de violência doméstica? Apoio. Mas isso é doutrina. Não é novo. A igreja tem três propostas para os casos em que se verifique violência doméstica: acreditar até ao fim que é possível a reconciliação; aceitar a separação de pessoas e bens temporária ou definitivamente, quando não for possível o reencontro; e, quando por qualquer razão essencial o casamento falhou, aconselha o recurso à nulidade do matrimónio. A verdade é que já anulou meia dúzia de casamentos... Sou bispo há dois anos e meio e já assinei meia dúzia de casos. Isto não é apoiar o divórcio, mas aceitar a decisão de anulação determinada pelo Tribunal Eclesiástico. Nesse caso, o homem e a mulher ficam novamente solteiros e podem voltar a casar e a refazer as suas vidas. Tem levantado a voz contra o enriquecimento ilícito e a injustiça... É injusta a grande diferença entre ricos e pobres em Portugal. É injusto e imoral que se criem empregos para pessoas que usaram, muitas vezes mal, o seu lugar de gestor público. Muitas vezes para seu benefício e prejudicando o bem comum. E que depois são premiadas com novos empregos e nomeações fictícias para continuarem a ter benesses chorudas, com prendas e luvas acrescidas. O que deve ser feito? Denunciar. Denunciar, proclamar valores e dar o exemplo. Vêm aí três actos eleitorais. Qual deve ser o papel da Igreja? Alertar para o direito e o dever de votar. É a primeira coisa. Depois, porque o acto de votar pressupõe a formação de uma consciência, cabe a cada um avaliar as propostas dos diferentes partidos. A estes, apelamos a que não deixem escondidas na gaveta propostas que mais tarde, sem aviso, aplicarão com o poder que lhes foi dado pelo povo. Quer revolucionar a Igreja? Não sou revolucionário. Nem quero. Sinto apenas que a Igreja deve ser prospectiva, estar atenta ao Espírito Santo, combater a neutralidade, aprofundar as propostas de renovação do Concílio Vaticano II e não andar atrás dos outros a apagar fogos. O protagonismo ajuda a mudança? O protagonismo é indesejável e desvia da unidade e comunhão. Temos de respeitar a individualidade intrínseca a cada ser humano e fazer tudo para que haja pessoas felizes no século XXI. O que pensa a Igreja da qual é pastor sobre homossexualidade? A homossexualidade é uma vivência sexual que não é aquela que a Igreja Católica defende e procura promover entre as pessoas. O que a Igreja reconhece, apoia e estimula é a relação normal para o casal e para a família: a relação entre o homem e a mulher. É dos que partilha a ideia de que a homossexualidade é um desvio? Não tenho competência técnica e científica para fazer uma afirmação peremptória sobre essa matéria. Mas existem vários estudos publicados, na sua maioria da autoria de psicólogos e psiquiatras, que têm dedicado boa parte da sua vida a aprofundar estas questões, a sustentar que a educação na infância influencia o comportamento homossexual. O ambiente familiar é então determinante na orientação sexual... Segundo alguns especialistas e estudiosos, sim. A educação na infância, o modo de vida das famílias e todo o contexto em que as crianças começam por desenvolver a sua personalidade, ditam o seu comportamento futuro. A vários níveis, inclusive sexual. Onde fica o factor hereditário da homossexualidade? A maioria dos psicólogos identifica sobretudo o contexto familiar e a sua influência na orientação sexual dos mais novos. São poucos os que ligam o comportamento homossexual à hereditariedade. Mas não sou redutor nem fundamentalista. Sei que também há muitos casos de médicos que justificam a homossexualidade masculina e feminina com factores de natureza hereditária. Temos de respeitar as duas teses. Em qualquer dos casos, qual é a postura do bispo de Viseu? A Igreja, e eu não sou excepção, faz apelo à educação nas famílias orientada para a promoção de valores que salvaguardem o bom ambiente familiar. Uma relação positiva entre o homem e a mulher, um amor profundamente vivido em todo o ambiente que rodeia pais e filhos, seguramente que será um bom exemplo e terá bons resultados na formação integral das crianças e adolescentes a todos os níveis. Seja qual for a natureza, a homossexualidade é uma realidade... A exemplo do que já afirmei a propósito de problemáticas que têm a ver com a vida das pessoas, a Igreja defende o ideal. Mas não vira as costas a quem não o segue. Pelo contrário. Em última instância, a Igreja quer que os homens e as mulheres, independentemente das suas opções e comportamentos, sejam pessoas felizes. Todos temos direito à felicidade."Educação influencia comportamento homossexual"
2009-05-08
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